Quando descobrimos que abrir os olhos e somente ver o que nos rodeia não basta mais, compreendemos que o essencial é invisível aos olhos. É preciso enxergar, conhecer, admirar e se encantar. Pois a vida é construída por imagens e mais imagens, inúmeras e diversas que competem por nossa atenção e ocupam todos os espaços. A invasão das imagens é tão forte que não conseguimos mais distinguir até que ponto elas nos dominam, ou até se elas já não se apropriaram de nós. Pode-se dizer que vivemos em uma sociedade das imagens; já não é mais possível viver sem elas, temos necessidade de consumi-las em todas as suas formas.
As imagens nos suprem das ausências por se fazerem presença em todos os sentidos, e por nos levar a lugares nunca antes vistos e mais por nos revelar tudo o que desejamos, preenchendo na maioria das vezes o vazio que nos assola. Por essa intensa relação com as imagens, estabelecemos diálogos com as mesmas e nos representamos através delas.
As imagens advêm da cultura, artifício criado pelo homem para enfrentar o seu medo da morte, que engloba mitos e ritos, mas vai muito além deles. A cultura vem como uma representação humana de tudo o que é percebido; é o universo simbólico que cria uma realidade que faz com que o homem se sinta apto e preparado para enfrentar as adversidades da vida. E a partir da cultura e dentro dela surge a comunicação, na qual o homem cria e estabelece vínculos com o outro; e é no âmbito comunicacional que o homem vai estabelecer-se como mídia primária, que é o próprio corpo, início e fim de toda comunicação, como definiu Harry Pross (1971).
Uma das formas de representação das imagens é a arte, atividade que supõe a criação de sensações ou de estados de espírito carregados de vivência pessoal e profunda (Ferreira, 1988), que se manifesta de diversas formas e dimensões, e se permite ser utilizada para diversas finalidades. A arte nasce da imaginação do artista e também da maneira na qual ele enxerga e absorve o mundo exterior; é a interiorização das impressões e sensações, olhares e sentimentos que serão devolvidos ao mundo de uma maneira maravilhosamente única.
Utilizando a imagem, a arte e toda a reflexão sobre cultura e comunicação como ponto de partida, reflito sobre o trabalho do artista Romero Britto e a utilização de sua arte na publicidade como forma de impulso para o consumo de produtos.
Romero Britto, artista pernambucano radicado nos EUA, é o maior expoente no Brasil da Pop-Art, estilo artístico do final dos anos 50 que se baseia no reprocessamento de imagens populares e de consumo, contemplando a linguagem da cultura urbana. Com um traço quase infantil, o artista explora formas geométricas e figuras, usa todas as cores, sempre muito vivas e vibrantes, transmitindo bom-humor, alegria e jovialidade, dando movimento e vida a figuras diversas. Romero não se prende a detalhes, e as imagens que produz são capazes de transportar o observador para um mundo repleto de sonhos e fantasias. E esse é justamente o motivo pelo qual suas obras são constantemente reproduzidas em produtos e na publicidade em geral.
Ao pintar, o artista tenta transpor para a tela tudo o que o mundo representa para ele; é a reprodução das imagens reais e imaginárias que foram consumidas e absorvidas por ele em determinados momentos. E a partir do instante em que o artista se transporta para a arte, ele se transforma; o mundo exterior se torna interior ao mesmo tempo em que vêm à tona em forma de pintura e expressão. Tudo isso funciona como forma de sedução e encantamento, e as sensações despertadas por essas manifestações será o ponto que aproximará a arte da publicidade, que deseja também seduzir e encantar para alcançar o seu objetivo principal, que é convencer e despertar desejos escondidos, levando as pessoas ao consumo da imagem primeiramente, e conseqüentemente ao ato de compra do produto em questão.
Atenção, interesse, desejo e ação. Esse é o processo que a publicidade quer desencadear, e para isso utiliza artifícios que convencerão o público-alvo de que o que está sendo oferecido é essencial e de suma importância para o seu bem-estar. A atenção será despertada pela beleza da arte, e pelo o que se vê através das imagens. As pessoas são o que consomem, são imagens e produtos, crenças e ideais, sonhos e fantasias. A arte, utilizada pela propaganda como uma forma de agregar valor ao produto, se transforma em magia e encanto; as pessoas se vêem nas imagens e se transportam para dentro delas, vão além e se vinculam; abandonam a idéia de que são somente pessoas e se tornam verdadeiras imagens de um mundo simbólico criado por elas mesmas.
A junção da publicidade e da arte nos leva a ter novas percepções de coisas já existentes e, até mesmo, comuns, e a enxergar o mundo ao nosso redor de uma maneira inteiramente diferente. A sociedade da imagem passa a ser também a sociedade do consumo, feita de escolhas e modelos de comportamento distintos; uma sociedade que é ao mesmo tempo real e lúdica, que se alimenta de imagens e sonhos. Passamos a consumir conceitos, não mais produtos; consumimos aquilo que antecipa as nossas expectativas, nosso prazer e nossas emoções. Não se compram objetos, compram-se status e estilo.
O uso da arte abstrata, alegre e colorida de Romero Britto em produtos variados não é em vão. Suas obras, que dão vida a qualquer espaço, surgem como impulso para o consumo a partir do momento em que combinam o talento do artista com a credibilidade dos produtos. A arte pop de Britto, que tem qualidade e atinge diversos públicos, além de entreter e cativar pessoas abre portas para o sucesso dos produtos que a ela se aliam. Marcas de bebidas, sandálias, porcelanas, perfumes e até de carros exploram as imagens do artista para ampliar o mercado de alcance e aumentar o volume de demanda e consumo através da sensibilidade e criatividade de Britto.
A utilização da arte como impulsionadora de consumo faz com que a obra de arte perca o seu valor de culto e passe a ter valor de exposição, o que possibilita a criação de uma maior proximidade e tatilidade (Benjamim apud Baitello, 2005). Quando a publicidade consegue, através de formas criativas e inusitadas, refletir os valores, sonhos e fantasias do consumidor, e o cativa pelo valor percebido do produto que apresenta, pode-se dizer que o objetivo principal é alcançado, pois o que sensibiliza o público é a viabilização de trocas emocionais, despertando sentimentos a partir da trilha sonora de um comercial de TV ou do texto do anúncio veiculado na revista. Esse ato de tocar as pessoas, de emocionar ou fazer sorrir, é o que proporciona o posicionamento ideal do produto na mente dos consumidores, criando fidelidade e reconhecimento. No caso da combinação do trabalho de Romero Britto e a publicidade, é gerada uma identificação e aproximação das imagens de arte com o público, que as reconhece nos produtos e cria uma espécie de confiança e segurança de consumo. Vários são os produtos que licenciaram as obras de Romero para reprodução em embalagens e peças, mas dois exemplos merecem atenção.
O sabão em pó OMO , marca de grande sucesso e tradição, lançou uma edição limitada do sabão, o OMO Cores, com estampas do artista, que contava com dois modelos de latas redondas e uma embalagem decoradas com diversas cores, desenhos e formas. Além das embalagens, a empresa fabricante do produto permitiu que Romero Britto estilizasse a logomarca do sabão, fato importante por ser a primeira vez na história da marca que a logo passou por uma releitura. O artista participou também do comercial de TV para o lançamento de OMO Cores.
Outro case de sucesso, que também conta com a “participação” das pinturas de Romero Britto, é a coleção criada por Amir Slama, estilista da grife de moda-praia Rosa Chá. Amir criou peças inspirando-se nas obras de Britto, e justificou sua escolha dizendo que o trabalho do artista é vibrante e transmite uma ótima energia. Apesar das peças exclusivas terem sido lançadas com um alto preço de compra, as oito mil peças produzidas foram vendidas rapidamente, fazendo com que o estilista decidisse por repetir a idéia em outra coleção. Essa experiência vivenciada pela Rosa Chá demonstra, mais uma vez, que as imagens de arte associadas a produtos é uma parceria que dá certo e que vai além dos objetivos esperados; é um “casamento” de imagens que resulta em sucesso de vendas.
A publicidade, que enuncia novas linguagens e desperta novas sensibilidades, é uma arte que se usa de outras artes para se fazer entender, para penetrar e fixar suas idéias no imaginário das pessoas. A inter-relação estabelecida entre arte e publicidade quer construir um novo sentido, uma nova interpretação do mundo em que vivemos; quer transmitir mensagens lúdicas de formas concretas para aguçar todos os sentidos humanos. Imagens abrangentes, imagens artísticas, imagens reais, imagens imaginadas, imagens da vida, imagens de nós mesmos, imagens que se perdem e imagens que encontram. Somos pessoas em imagens e imagens de pessoas, somos visão e audição, somos o todo que sempre busca se completar com o que vemos ao redor.
Aluno: Sergio Augusto dos Santos Rabelo Silva
Turma: 1001
Fonte: Site Closet Online
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